Geradoras triplicam ganhos com venda de energia no mercado de curto prazo
Cesp, Cemig e Copel ganharam juntas R$ 1,6 bi no segundo trimestre
16/08/2014

As geradoras de energia Cesp, de São Paulo, Cemig, de Minas Gerais, e Copel, do Paraná, ganharam juntas R$ 1,6 bilhão no segundo trimestre deste ano com a venda de energia no mercado livre, cujos preços estão altos devido à falta de chuvas. O número é quase 200% maior em relação ao mesmo período de 2013, quando as receitas somaram R$ 548 milhões. Porém, os ganhos não devem se repetir nos últimos trimestres deste ano, dizem especialistas, que projetam piora nos balanços das companhias. Para eles, a redução dos ganhos vai ser provocada pela queda na geração hidrelétrica, com menor volume de água nos reservatórios das usinas, uma vez que o período seco vai até novembro.

Essas três empresas, que ficam em estados governados por partido de oposição, ganharam com a venda de energia no mercado livre, por não terem aderido à antecipação da renovação dos contratos de concessão com base na MP 579, de 2012, que provocou uma redução média de 20% nas contas de luz no ano passado.

RESULTADO DEVE PIORAR
Com isso, ficaram com parte de sua energia disponível para negociar livremente no mercado. Do lado oposto, companhias como Light, distribuidora do Rio, Tractebel, uma das maiores geradoras de energia privada do país, e o grupo Eletrobras registram perdas no segundo trimestre deste ano, por terem sido obrigadas a comprar energia no mercado para cumprir seus contratos.

— Os resultados das empresas vão piorar nos próximos trimestres, pois não haverá chuvas. Cesp, Copel e Cemig alocaram energia no início deste ano e, como estratégia, venderam no segundo trimestre para aproveitar o início do período seco, quando os preços sobem. Mas agora não vão ter mais tanta energia para vender — disse Lucas Marins, analista da corretora Ativa.

O economista Marcel Caparoz, da RC Consultores, também vê piora nos balanços, apesar de o resultado operacional continuar bom, já que os preços da energia vão se manter altos no mercado.

Segundo a Cemig, a receita com a venda de energia no mercado à vista somou R$ 940,3 milhões no segundo trimestre, uma alta de 259% em relação ao mesmo período de 2013. A companhia informou que o preço da energia subiu de R$ 250,58 por megawatt/hora (MWh) para R$ 682,20/MWh desde o ano passado. Assim, o lucro foi 20% maior: R$ 740,8 milhões.

Caso semelhante ocorreu com a Cesp, cujas receitas com a energia no mercado livre subiram 77,5%, para R$ 317,6 milhões. A empresa paulista viu a importância do segmento "curto prazo" em sua receita subir de 17% para 34,3%. Na Copel, a alta com a receita da venda de energia foi de 256%, para R$ 382 milhões. Só não aumentou o lucro líquido, segundo Marins, pela Copel ter segurado parte da alta das tarifas para o consumidor.

— A perspectiva é de perdas, já que a hidrologia vai piorar — afirmou Nivalde de Castro, coordenador do Grupo de Estudos do Setor Elétrico da UFRJ.

Para Caparoz, da RC, a demanda terá que ser atendida fortemente pela geração térmica, mantendo elevados os preços da energia no mercado livre.

Cristopher Vlavianos, presidente da comercializadora Comerc Energia, lembrou que essas empresas terão ainda que comprar no mercado à vista parte da energia não gerada pelas hidrelétricas.

— Quem não aderiu à renovação dos contratos de geração, independentemente de ganhar menos, está numa situação bem melhor de quem aderiu.

 

Ministério vê risco de caos com decisão da Cesp de reter vazão
Para secretário Zimmermann, houve 'quebra na cadeia de comando'

O secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia (MME), Marcio Zimmermann, avaliou nesta sexta-feira que a administração do sistema interligado de energia elétrica no país pode ficar caótica se outras usinas tomarem a mesma medida que a Companhia Energética de São Paulo (Cesp) e o comando do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) for colocado em xeque. A Cesp ignorou recomendação do ONS para elevar a vazão da usina do Rio Jaguari, que faz parte da bacia do Rio Paraíba do Sul. Do ponto de vista do setor elétrico, o governo federal teme, principalmente, que o precedente aberto pela Cesp seja seguido por outros e, assim, o comando centralizado do setor venha a ruir.

— O que é grave aqui é que a Cesp quebrou a cadeia de comando. É a primeira vez na história do setor que uma usina se rebela ao comando do operador. Se todo mundo resolver fazer isso, o sistema vira um caos — disse Zimmermann.

INTERVENÇÃO FEDERAL
Pela primeira vez desde 8 de agosto, quando o GLOBO revelou que a Cesp reduzira deliberadamente a vazão do Jaguari para conter água, um representante do Executivo federal se manifestou abertamente sobre o tema. Perguntado sobre que punições a Cesp, controlada pelo governo de São Paulo, poderá sofrer pela atitude, Zimmermann disse que já existe uma apuração em curso pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e citou as possibilidades previstas na lei, desde multa à intervenção federal.

— O processo que a Aneel está conduzindo tem a projeção de multa de até 2% do faturamento da concessionária. E depois, toda concessão, quando entra em conflito com o órgão regulador e se persiste (no conflito), aí pode levar a coisas mais sérias, como intervenção federal.

Segundo Zimmermann, a ação do estado de São Paulo tirou do ONS a capacidade de gerir os reservatórios da bacia do Paraíba do Sul de uma maneira adequada. Daí o risco de desabastecimento de água. Ele explicou que o sistema interligado de energia, ou o abastecimento elétrico de Rio e São Paulo, não corre risco significativo com o comprometimento da capacidade das usinas ao longo do Paraíba do Sul, aí incluído o complexo de Lajes, da Light, porque a energia gerada ali é pouca em relação ao total nacional.

Na segunda-feira, deve haver uma reunião entre os envolvidos na crise, para buscar uma solução. Nos bastidores, os governos federal e de São Paulo já vêm acenando com uma possibilidade de conciliação. Esse acordo combinaria um controle maior sobre o desperdício de água e a prioridade do uso para abastecimento humano, em detrimento da geração das hidrelétricas ao longo da bacia do Paraíba do Sul.

— Eu acredito que o bom senso vai levar todo mundo a caminhar, já que esse sistema brasileiro de água, da articulação da ANA (Agência Nacional de Águas) com os órgãos estaduais, sempre tem sido bem-sucedido. Tenho certeza de que vão achar um caminho correto, técnico. Não tem política (envolvida) — disse Zimmermann.

Nesta sexta, a ANA manteve reduzida a quantidade mínima de água que chega à barragem de Santa Cecília, no Rio, como forma de exigir menor vazão na calha do Paraíba do Sul e, portanto, segurar mais água nos reservatórios. Essa condição extraordinária ocorre desde julho e foi prorrogada até 30 de setembro.

 

Fonte: O Globo