Hidrelétrica perde espaço em plano energético
Geração hídrica prevista para os próximos dez anos será menos da metade da matriz pela primeira vez 16/10/2019 Valor - 15.10.2019 - O próximo Plano Decenal de Expansão de Energia (PDE) 2029, cuja versão preliminar deve ser divulgada neste mês pelo Ministério de Minas e Energia (MME) e colocada em consulta pública, vai trazer uma quebra de paradigma no setor elétrico brasileiro. Carro-chefe do parque gerador de energia do país, as hidrelétricas, pela primeira vez, responderão responderão por menos da metade (49%) da capacidade instalada da matriz elétrica brasileira, no fim da próxima década. De acordo com o documento, que está pronto à espera da decisão do MME, a queda da participação das hidrelétricas (que atualmente respondem por 64% da capacidade do parque gerador) será compensada pelo crescimento das termelétricas (de 14% para 19%), principalmente a gás natural, devido ao potencial de recursos oriundos do pré-sal, e outras fontes renováveis, como eólica e solar (de 22% para 32%). O novo paradigma reflete a mudança de perfil do parque gerador. O quadro é demonstrado pela oferta habilitada para o leilão de energia nova da próxima sexta-feira, do tipo “A-6”, A mudança do perfil da geração de energia é vista como algo positivo pelo sócio-líder do setor elétrico da consultoria Deloitte, Guilherme Lockmann. “Os mercados europeus e americanos querem a descarbonização, enquanto a visão brasileira é de diversificação da matriz, o que é benéfico. Isso reduz a dependência de chuvas como aconteceu no passado”, afirma. O especialista defende que o Brasil não abra mão da vocação natural para a hidreletricidade. O desenvolvimento de aproveitamentos como de São Luiz do Tapajós (PA), de cerca de 8 mil MW, “é algo que tem que ser estudado”. Estudo global lançado recentemente pela Deloitte concluiu que energias renováveis, principalmente eólica e solar, estão não só se tornando fontes convencionais de eletricidade, mas ganhando a preferência dos consumidores ante outras tecnologias. Nessa linha, o presidente no Brasil da geradora renovável francesa Voltalia, Robert Klein, ressalta parte da transição energética tem sido impulsionada pelo consumidor, que busca reduzir a pegada de carbono. Estimativas indicam que já existem 2 gigawatts (GW) de capacidade de projetos eólicos contratada por consumidores livres em forma de “PPAs” (sigla em inglês para contratos de longo prazo de fornecimento de energia) no Brasil. Para o coordenador do Grupo de Estudos do Setor Elétrico (Gesel) da UFRJ, Nivalde de Castro, a projeção para 2029 consolida o fim da hegemonia das hidrelétricas na matriz. Ele, no entanto, afirma que a fonte continuará sendo importante. “A perda de participação não significa perda de importância na matriz e na operação do sistema.” Segundo ele, cada vez mais os reservatórios das hidrelétricas terão relevância no ajuste fino da oferta e demanda de energia ao longo do dia, e isso exige ajustes no modelo de comercialização do setor. Segundo o presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Thiago Barral, apesar da mudança do perfil, a matriz elétrica brasileira continuará com forte componente renovável. As fontes limpas respondem hoje por cerca de 80% da capacidade do parque gerador brasileiro. “É possível manter, ou até ampliar, esse potencial”, disse, em relação a 2029. Barral explicou que um fator importante são os requisitos de flexibilidade das fontes, caracterizada pela intermitência na geração. Segundo ele, o novo PDE trará, pela primeira vez uma discussão sobre o tema. O executivo, porém, acrescentou que, a implementação do sistema de preços-horários na operação do sistema brasileiro e no mercado de energia, em 2021, já dará sinal econômico relativo aos requisitos de flexibilidade. Lavinia Hollanda, diretora-executiva da consultoria Escopo Energia, destaca a importância de valorar corretamente os atributos de cada fonte, além da própria energia fornecida. Entre esses atributos, estão a contribuição, positiva ou negativa, que ela traz para as emissões de gases de efeito estufa e os custos e benefícios que cada uma gera para o sistema elétrico. Por Rodrigo Polito |
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