TCU autoriza privatização da Eletrobras; veja quais são os próximos passos
Governo trabalha para concluir operação ainda no primeiro semestre 19/05/2022 Valor Econômico - Após quase cinco horas de discursos, o plenário do Tribunal de Contas da União (TCU) aprovou ontem o projeto do governo para a privatização da Eletrobras. A maioria dos ministros acompanhou o parecer do relator, Aroldo Cedraz, restando vencido o ministro Vital do Rêgo, que sugeriu vários ajustes no processo. A decisão encerra um processo inaugurado em 2018, ainda no governo de Michel Temer. Se concluída, será a primeira privatização do governo Jair Bolsonaro. Com o sinal verde do órgão de controle, o governo deseja protocolar já na próxima semana a operação de aumento de capital da empresa na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e na Securities and Exchange Commission (SEC), órgão regulador do mercado acionário americano. Paralelamente, o sindicato de bancos responsável pela operação - liderado pelo BTG - organizará um “road show” para divulgar o processo com investidores nacionais e estrangeiros. Algumas praças financeiras, como Nova York e Londres, deverão estar no roteiro da instituição. O governo deverá ainda lançar, por meio da Caixa Econômica Federal, uma plataforma no aplicativo do FGTS pela qual trabalhadores poderão optar por investir parte de seus recursos na compra de ações da Eletrobras. Está previsto o uso de até R$ 6 bilhões oriundos do fundo. Em seguida, haverá o chamado “bookbuilding”: a coleta das manifestações de interesse na aquisição dos papéis. A demanda determinará o preço final das ações, quando finalmente ocorrerá a liquidação. A expectativa é que aconteça no fim de junho. Após a operação, a participação da União no capital votante da Eletrobras será reduzida dos atuais 72% para 45%. O controle da empresa passará, então, a ser detido por investidores privados, em uma modalidade conhecida como “corporation”, na qual não há nenhum grande acionista. O aval do TCU foi anunciado após a apresentação de um voto revisor de Vital do Rêgo. Ele apontou ao menos seis supostas ilegalidades no processo de privatização, entre as quais uma possível privatização involuntária da Eletronuclear, subsidiária que deve permanecer sob controle do governo. Isso aconteceria devido à dívida de R$ 2,7 bilhões da Eletronuclear com a Eletrobras, referente ao represamento de dividendos desde 2010. Além de apontar a ausência de publicação dessa dívida nas demonstrações contábeis, Vital disse que a forma de pagamento poderia transferir aos acionistas privados a maior fatia da Eletronuclear. Pelo desenho apresentado pelo governo, ao final da privatização a União terá 64% do capital votante da Eletronuclear, ficando a nova Eletrobras com os 36% restantes. Os sócios privados também teriam 99% das ações preferenciais, sem direito a voto. Ocorre que a dívida entre as duas empresas poderia mudar essa correlação. De acordo com a legislação vigente, as ações preferenciais passam a ter direito a voto caso os dividendos não tenham sido pagos devidamente. Nesse cenário, considerando a dívida de R$ 2,7 bilhões, os privados teriam maioria no capital votante da Eletronuclear, ou seja, na prática ela seria privatizada. “A política nuclear brasileira vai ser privatizada. Nem o país mais democrata do mundo abdicou de sua política nuclear”, criticou Vital. Ele também apresentou problemas na política de contingenciamento da Eletrobras. A empresa separou R$ 9 bilhões para possíveis despesas judiciais somente no balanço do terceiro trimestre do ano passado, operação que elevou o montante total de provisões para R$ 26 bilhões. Para Vital, a depender do resultado das ações judiciais que motivaram os contingenciamentos, a União poderia ser lesada. Isso porque uma eventual vitória da estatal nos tribunais transformaria as provisões em lucro e, consequentemente, em dividendos para os acionistas privados, que terão uma fatia maior na empresa. Ele também apontou falhas na precificação de Itaipu e classificou a privatização como “ultrajante” e “negócio de pai pra filho”. “Itaipu está sendo quase dada. Há uma trama por trás de tudo isso.” Os argumentos não foram suficientes para mudar o rumo do julgamento e a privatização foi autorizada por sete votos a favor e um contra. A presidente do TCU, Ana Arraes, foi a única a demonstrar apoio à tese de Vital. Ela, porém, não votou, o que só ocorre quando há necessidade de desempate. Os demais ministros defenderam a legalidade do processo e lembraram que o mercado corrigirá eventuais distorções apresentadas pelo voto de Vital. “Dentro da derrota da tese, tivemos uma clara vitória. As ilegalidades por mim apontadas permanecem, a meu ver, não esclarecidas. Durante os debates, foi dito que o mercado poderia ajustar os rumos da privatização. Mas não é dever constitucional do mercado corrigir as ilegalidades identificadas”, disse o ministro vencido. Ele acredita que o processo será judicializado. Por Murilo Camarotto e Daniel Rittner |
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