'As pessoas não acreditavam que gás de lixo dava dinheiro', diz líder na produção de biometano
Para cofundador do grupo Urca e CEO da Gás Verde, demanda para descarbonização da produção supera oferta do produto 25/04/2024 Folha de SP - 20.04.2024 | O grupo Urca foi fundado no Rio de Janeiro, em 2018, já focado em energia renovável. De lá para cá, deixou de ser regional para se tornar nacional. O motor da rápida expansão foram aquisições e investimentos na geração de biometano por meio de sua subsidiária Gás Verde. Foi uma aposta considerada ousada. Agora, o biometano é mais uma estrela na transição energética, mas até bem pouco tempo fazia o empresariado torcer o nariz —no sentido exato da expressão. Produzido a partir da purificação do biogás extraído de lixo, de restos agropecuários e até de esgoto, o produto tem a mesma composição do gás natural fóssil, com a diferença de ser renovável. "Quando fechei os primeiros contratos, tinha gente que nem acreditava que saía gás do lixo ou que dava para ganhar dinheiro com aquilo", diz Marcel Jorand, CEO da Gás Verde e cofundador do grupo, com Maurício Carvalho e Pedro Assumpção. A empresa é líder no mercado brasileiro de biometano. A unidade em Seropédica, que recebe lixo da cidade do Rio de Janeiro, é a maior produtora desse gás na América Latina. Tem entre os seus clientes a rede de supermercado Dia, a fabricante global de vidros Saint-Gobain, o grupo L’Oréal de produtos de beleza e a fabricante de bebidas Ambev, que utiliza o produto na unidade de Cachoeira de Macacu (RJ), convertida na primeira cervejaria do Brasil movida 100% a biometano. Em que momento perceberam que o biometano era um bom negócio? A especificação da ANP [agência reguladora de combustíveis] para o produto veio em 2016. Isso estabeleceu a equivalência do biometano como o gás natural —injetar no gasoduto e vender no posto de gasolina. Foi aí que começaram a perceber que aquele produto podia substituir o gás natural, mas com a grande vantagem de ser renovável. Hoje, as pessoas entendem que ele faz parte da economia circular e é sustentável. Passou a ser um produto que traz não apenas uma solução de energia limpa para as empresas na transição, mas que também valoriza quem cuida dos resíduos de forma adequada, pois eleva a receita de quem investe em aterros sanitários ou tratamento de restos em áreas rurais. O biometano tem um valor agregado muito maior porque é um combustível. Você pode levar para uma indústria, um carro, um veículo pesado. É cotado em real e não sofre a variação de um barril de petróleo, com guerra e câmbio. Tem previsibilidade. Qual é o preço do biometano? Tem um prêmio? É verdade que a demanda hoje por biometano é muito maior que a oferta? Faltam investimentos ou empreendedores? Essas dez unidades estão focadas em quê? Pergunto porque se fala muito no potencial do agro, mas a gente vê o avanço mais rápido de produção em aterro sanitário. A empresa sente falta de uma rede de gasodutos? Pergunto porque existe a discussão sobre a necessidade de implementação de uma rede de gasodutos, incluindo para atender pré-sal e gás verde. Certamente, um país com a vocação do Brasil para a produção de gás precisava de mais. A produção do pré-sal está concentrada na costa, e os gasodutos também. Não há como beneficiar quem está no centro do país. O agro é nosso principal gerador de receita e de infraestrutura. Fala-se muito em rodovia, ferrovia, que seriam necessárias, sim, mas também precisamos pensar no acesso ao gás natural e ao biometano. Hoje, para nós, o gasoduto não faz falta. Mas, para o Brasil, como estratégia de crescimento, o que nos afeta, é importante ampliar a rede de gasoduto, chegando ao Centro-Oeste, oeste de São Paulo, Triângulo Mineiro, Goiás, centros de produção de alimentos, produtos industriais, que demandam gás, e também áreas com grande potencial de biometano. Considero estratégica essa descentralização de produção, que pode ser feita pelo agro, até porque o agro é um grande consumidor de diesel. Seria um grande impulso, para a descarbonização, a economia circular e o autoconsumo. Seria possível, por exemplo, criar corredores de postos de combustíveis de biometano no interior. Tramita no Congresso o PL dos combustíveis do futuro, e o biometano é um deles. O sr. tem algum receio em relação à proposta em discussão? Alguns temem uma ação da indústria petrolífera para que o PL, no fim, não contribua para o avanço do biometano. Não faz sentido o debate para rebater um combustível 100% renovável, atrelado à inflação em real, que é intercambiável com o gás natural, compete de igual para igual com o diesel, pode ser produzido de forma descentralizada, gerando emprego, impostos, e ainda substituir combustível importado. Não posso levar a sério quem achar que o biometano não faz sentido. O gás natural já é combustível de transição energética. O PL trata de várias soluções que podem incentivar o Brasil na produção de combustíveis renováveis. Pode contribuir na implementação, ainda que gradual, do biometano como produto para a descarbonização. Se você pegar um caminhão a diesel e converter para gás natural, reduz as emissões. Se injetar um pouco de biometano, reduz mais ainda. É um baita ganho para todo mundo. Raio-X Marcel Jorand, 41 O Grupo Urca Energia A Gás Verde é a maior produtora de biometano da América Latina. Atua em seis estados, com 12 unidades, processa mais de 1 milhão de m3 de biogás por dia, gerando energia elétrica e produzindo 170 m3 de biometano por dia a partir de resíduos de aterros sanitários. A produção de biometano da empresa deve ultrapassar os 500 mil m3 por dia até 2026. Tem 190 funcionários. Entre seus concorrentes está a Orizon. |
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